16 de novembro de 2016

Greenpeace: efeitos das mudanças climáticas já prejudicam vida dos brasileiros

Dez anos depois da publicação do último relatório do Greenpeace sobre os prejuízos decorrentes das mudanças climáticas, novo documento da entidade mostra que pouca coisa mudou. “O que tem de mais emblemático é que, dez anos depois, ainda não conseguimos arrumar uma solução para evitar as mudanças climáticas. Continua uma discussão muito grande, as coisas não saem do papel e os efeitos já estão acontecendo”, avalia o coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, Márcio Astrini.

“Uma década depois ainda tem acordos sendo discutidos, de quem é a responsabilidade, que tem que ajudar mais com dinheiro. Enquanto isso o clima, na vida real, vai alterando e já prejudicando a vida das pessoas”, completa. Um efeito concreto na rotina das pessoas, segundo Astrini, é a chamada bandeira tarifária, que traz uma variação na cobrança da energia elétrica aos consumidores.

Bahia - Maior reservatório do Nordeste, Sobradinho tem seca histórica (Divulgação Chesf)
Redução da vazão dos rios é uma das consequências das mudanças do clima, segundo GreenpeaceDivulgação Chesf
Pelo modelo de bandeiras tarifárias, quando a energia vem das usinas hidrelétricas, a tarifa tem um valor, mas se o governo precisa utilizar as termelétricas – que são mais poluentes e mais caras – o consumidor paga um valor adicional pela eletricidade que chega à sua casa.

“O Brasil produz muita energia de hidrelétrica, que depende do rio corrente para gerar energia. Tem chovido de forma desregular, quer dizer, tem horas que aquele rio está muito cheio e tem horas que está muito seco”, disse Astrini sobre uma das previsões ligadas ao aquecimento global apontadas no relatório, que é a tendência de redução da vazão dos rios. Como 64% da eletricidade do país vêm das hidrelétricas, menos água nos rios significa menos produtividade e risco de energia mais cara.

Soluções

“Isso impacta diretamente na conta de luz das pessoas. Muita gente está sentindo isso na conta”, acrescenta. 

Astrini aponta duas soluções que podem evitar o agravamento de prejuízos causados pelas mudanças climáticas: implementar energias renováveis – como solar, eólica e biomassa – e acabar com o desmatamento. As medidas, segundo o ambientalista, não só contribuem para o combate ao aquecimento global, como tornam o Brasil mais resistente a essas mudanças.

“Precisamos bolar outras formas de gerar energia no país e eletricidade para a casa das pessoas. Temos muito sol, temos muito vento, temos uma capacidade de produção de agricultura muito grande, e essas três coisas podem dar pra gente energia solar, eólica e biomassa. O Brasil investe muito pouco nisso”, pondera. Segundo o coordenador do Greenpeace, variar a matriz energética pode dar ao país maior segurança no setor, sem precisar recorrer a opções poluentes como as termelétricas a carvão e a gás.

desmatamento
Combate ao desmatamento deve ser prioritário no enfretamento à mudança do clima no Brasil Arquivo/Agência Brasil
A segunda ação seria sobre as florestas. “Se o Brasil eliminar o desmatamento – que é a nossa maior fonte de emissões de gás de efeito estufa –, além de diminuir as emissões globais, ele também preserva uma floresta como a Amazônia e o Cerrado”, disse.

Além do benefício direto para a conservação do bioma, Astrini destacou a importância da Amazônia como regulador climático. “Alguns estudos dizem que, devido à existência da Amazônia, é que tem a regularidade da quantidade de chuvas no sul, no sudeste e no centro-oeste do país, que são exatamente os lugares que mais produzem agricultura. Então, se a gente desmata essa floresta, temos um efeito contrário duplo: vamos emitir muito carbono e retirar do país esse regulador climático.”

Indígenas abrem a 9ª Assembleia do Povo Terena (MS)


Por Tereza Amaral
com Conselho do Povo Terena

Em meio a rezas e danças tradicionais, caciques, lideranças de retomadas, guerreiros, rezadores, mulheres e jovens participaram, na noite de ontem, da abertura da 9ª Grande Assembleia na Aldeia Bananal, Terra Indígena Taunay-Ipegue, no município de Aquidauana (MS).

A organização tradicional naquele estado - Conselho do Povo Terena - , que integra a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e tem assento na Organização das Nações Unidas (ONU), vem promovendo o evento em defesa do território tradicional. Além da luta pela demarcação de TIs (Terras Indígenas), o conselho também atua na defesa judicial dos direitos dos povos indígenas.

Em pauta, a partir de hoje até sexta-feira, temas, tais como: educação escolar indígena, sustentabilidade e meio ambiente, saúde nas comunidades e políticas públicas que afetam comunidades indígenas.

Durante o evento vai acontecer o “II Encontro de pesquisadores indígenas com suas lideranças”, uma oportunidade para alunos, pesquisadores e profissionais indígenas apresentarem às lideranças pesquisas e trabalhos realizados em universidade. Pesquisador não-indígena também poderá apresentar trabalho desenvolvido na comunidade. Delegações, como da Aldeia Buriti, chegam hoje na Aldeia Bananal.

Confira Programação aqui.

Fotos _ Conselho do Povo Terena

15 de novembro de 2016

Nota da Relatoria de Povos Indígenas sobre indicação de militar para a Funai no MS


A Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma Dhesca manifesta solidariedade ao movimento indígena contra a nomeação do coronel da reserva, Renato Vidal Sant’anna, para o cargo de Coordenador Regional da Fundação Nacional do Índio – Funai em Campo Grande (MS).
A nomeação foi publicada nesta quinta-feira (10) no Diário Oficial da União e surpreendeu a todos. O coronel substitui Evair Borges, Terena que atua há 16 anos na Funai e estava na Coordenação Regional desde abril de 2014.
Conforme esta Relatoria e organizações indígenas e indigenistas vêm acompanhando e denunciando, o Mato Grosso do Sul é um dos estados com a maior incidência de violações de direitos humanos dos povos indígenas e casos de racismo institucional. Nesse cenário, faz-se ainda mais urgente a existência de uma Funai fortalecida, transparente e que conheça e respeite os direitos dos povos indígenas.
Consideramos que a nomeação de um militar, sem qualquer consulta aos maiores interessados – os povos indígenas da região – é um enorme retrocesso e uma violação à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o país é signatário e que afirma que todas as decisões que interfiram nos interesses destes povos devem ser contar com o diálogo e a participação dos povos indígenas.
Manifestamos nosso posicionamento contrário à nomeação de Renato Vidal Sant’anna, bem como de qualquer outra pessoa que não tenha qualificação para atuar frente a um órgão tão fundamental para a defesa dos direitos e das políticas públicas para os povos indígenas como é a Funai.
Brasília, 12 de novembro de 2016.
Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas

“Não foi um acidente”, diz Ailton Krenak sobre a tragédia de Mariana

“Não foi um acidente”, diz Ailton Krenak sobre a tragédia de Mariana



No dia 7 de setembro de 2016, pesquisadores do tema Povos Indígenas no Brasil, do ISA, entrevistaram o líder Ailton Krenak sobre os impactos no território krenak do desastre de Mariana (MG), o maior crime socioambiental já registrado no Brasil e que completou um ano no último dia 5/11.

Lama cobre o Rio Doce, na cidade capixaba de Resplendor


Para ele, a derrama de rejeitos da barragem do Fundão, da mineradora Samarco/BHP Billiton, da Vale, que devastou o distrito de Bento Rodrigues e o Rio Doce, de Minas Gerais até o Espírito Santo chegando ao Oceano Atlântico, foi um tiro de misericórdia em um povo que sofre há décadas com os impactos da mineração em suas terras: “Eles botaram o rio em coma e eu quero ver quem é que vai conseguir sobreviver sem água. Se os Krenak aguentaram toda essa tortura ao longo de quase 100 anos, inaugurada na década de 1920, agora com o rio morto, como vai ficar?”, questiona.
A íntegra da entrevista, em que Krenak fala ainda sobre a luta pelo reconhecimento de suas terras em Minas Gerais, sobre os ataques aos direitos dos índios e a política dos "brancos" para o Brasil, você confere na próxima edição do livro Povos Indígenas no Brasil 2011-2015, do ISA.
Veja abaixo alguns trechos do depoimento de Ailton Krenak a respeito do crime ambiental de Mariana.
Ailton Krenak durante entrevista ao ISA, em São Paulo
“O evento mais dramático que o povo da Bacia do Rio Doce vive, segue vivendo, é essa derrama de veneno na cabeceira do rio. Aquela gosma da Samarco e da Vale, aquele material tóxico, recobriu as lajes de pedra com uma coisa plástica, que não deixa nem que o lodo, o líquen, que novos materiais orgânicos se constituam ali para criar um ambiente de vida aquática. A ictiofauna, as espécies de água, foram todas eliminadas.

Não foi um acidente. Quando eu ouço perguntarem sobre ‘o acidente’ de Mariana, eu reajo dizendo que não foi um acidente. Foi um incidente, no sentido da omissão e da negligência do sistema de licenciamento, supervisão, controle, renovação das licenças, autorização de exploração. O Estado e as corporações constituíram um ambiente promíscuo e delinquente, em que ninguém controla ninguém e no qual os engenheiros e os chefes de segurança, que informam os relatórios, também sabem que não tem consequência nenhuma se eles matarem um patrimônio inteiro, uma vila inteira ou, eventualmente, se matarem uma comunidade inteira.
Eles estão assentados sobre uma história colonial miserável, em que acham que fazem um favor enorme de estar comendo aquelas montanhas, empacotando aquelas montanhas e registrando um aumento no PIB brasileiro. Essa mentalidade estúpida, desse capitalismo que não dá nem pra chamar de selvagem, só pensa na exaustão dos recursos da natureza – que eles muito apropriadamente chamam de ‘recursos naturais’ e, cinicamente, matam rios, montanhas, florestas com a justificativa de que estão fazendo o desenvolvimento.
Watu, que é como nós chamamos aquele rio, é uma entidade; tem personalidade. Ele não é um ‘recurso’ como os pilantras dos engenheiros da Vale, administradores do Governo, da Agência Nacional das Águas, do Comitê de Bacias sugerem. Eles criam toda essa linguagem despistante, malandra, para sugerir que foi um acidente, que eles usam recursos e que as pessoas, os coletivos, as comunidades que são atingidas por esse dano, são vitimadas por esse evento, são ‘beneficiários’. Os beneficiários da presença dessas corporações na nossa região ficam sujeitos a acordar soterrados por uma lama venenosa.
Dia 5 de novembro [de 2016] completa um ano desde que milhares de famílias foram, de uma hora para outra, divorciadas do corpo do rio. Os municípios que estão ao longo dessa bacia têm uma população de um milhão e meio de pessoas, diretamente afetadas pela derrama da lama tóxica sobre o Rio Doce. “Diretamente” significa que, indiretamente, pode-se colocar isso na casa dos dez milhões. Mas e a biodiversidade? A Bacia do Rio Doce foi cauterizada. Agora, aquele corredor de 800 km é uma calha morta. E surpreendeu a todos nós que, logo nos primeiros 15 dias daquele grave desastre, as pessoas tenham saído em defesa da Vale e da Samarco, dizendo: ‘Ah, vamos recuperar o Rio Doce’. Ora, o que nós temos, de fato, é que a Bacia do Rio Doce vem sendo assaltada pelas atividades de mineração e também pela implantação das indústrias de processamento de celulose e de minério”.

Impactos históricos

“O Rio Doce, o Watu, pode ser pensado como um lugar onde, na primeira metade do século XX, até a década de 1920, os Krenak viviam ainda com a inocência de ter um rio sagrado, carregado de significado, de símbolos, onde os espíritos da água interagiam com as pessoas – de onde as famílias tinham certeza de que podiam tirar comida, remédio. Quando a atividade de abrir a estrada de ferro Vitória-Minas se iniciou, foi o fim da vida livre dos Krenak no Rio Doce. Há imagens que mostram os engenheiros aliciando os índios para cortar troncos na floresta do Rio Doce para fazer os dormentes. E, como os índios tinham curiosidade da presença daqueles trabalhadores, eles acabaram atravessando o rio e iam para a margem direita para ver os brancos, ficar perto deles. Essa curiosidade dos Krenak custou caro, porque pegaram muitas doenças dos brancos e morreu muita gente; crianças, velhos. Um dos marcos do desastre que tem sido a ocupação do Rio Doce para os Krenak é a abertura da ferrovia Vitória-Minas. Aí é que a vida dos índios virou um inferno.
E, com todo o abuso do Estado, todo o autoritarismo característico daquela época, os índios eram como moscas. Se o trem matasse meia dúzia deles, não fazia diferença alguma. Há relatos dos antigos sobre o tanto de gente que morria atravessando a ferrovia, porque não tinha nenhum sistema de vigilância, nem de alerta, para explicar aos índios que não podiam atravessar o leito da ferrovia – ou que não podiam caminhar acompanhando os trilhos do trem. Eles eram surpreendidos com o trem em cima deles, às vezes.
É desse tempo que os Krenak deram pro trem o nome de Guapo. É uma expressão muito curiosa, porque é como se eles estivessem chamando o trem de ‘braço mecânico’. É uma ideia totalmente abismada; eles achavam que aquela ferragem que movimenta o trem era uma coisa viva, um braço. A ferrovia foi se consolidando cada vez mais. Colocou as bitolas largas, máquinas maiores: a terra dos índios diminuindo e a máquina aumentando. As nossas montanhas virando mercadoria nesses trens e vagões; todas composições grandes para transportar minério para o porto do Espírito Santo.Toda essa industrialização da década de 1940 e 50 para cá, sangra a vida dos Krenak, encurralou as famílias. Essa derrama agora foi o tiro de misericórdia.
A aldeia está sendo abastecida por dois caminhões pipa que passam nas casas enchendo caixas d'água duas vezes por semana e entregam nas casas das famílias um fardo com 20 garrafas de 2 litros [de água mineral], porque o Ministério Público obrigou a Vale e a Samarco a fazerem a entrega para essas famílias que foram vítimas desse crime ambiental incalculável.
Você imagina como uma comunidade ou uma família vai criar bichos sem água? Qual sustentabilidade tem manter aquela população bebendo água mineral? Isso parece aquela história da Revolução Francesa, próximo da tomada da Bastilha, quando falaram para a rainha que o povo estava sem pão e ela respondeu: 'Mandem comer brioches!'. Então, esses cretinos, quando disseram que o povo do Rio Doce estava sem água, eles falaram: ‘Bebam água mineral!’”

Um rio em coma

“Mesmo que a empresa seja condenada a suprir aquela gente com água mineral naquele lugar, parece que você está colocando uma pessoa num balão, botando soro nela, oxigênio, e ela vai ficar em coma como o rio. O rio está em coma. De certa maneira, essa prontidão que as pessoas estão vivendo na margem do rio agora deixa elas no mesmo estado simbólico de coma em que o corpo do rio está. Eu vejo isso como uma coisa tão assustadora, que tenho dificuldade de falar no Watu sem me revoltar.
A desgraça de nós estarmos vivendo um momento político extremamente pobre também não cria canais de interlocução. Se não fosse o Ministério Público ficar esgoelando em cima desse episódio... O Executivo estadual anda de joelhos para as mineradoras; e o Governo Federal, a [então] ministra do meio ambiente sobrevoou a Bacia do Rio Doce e teve a cara de pau de dar um relatório três semanas depois, dizendo que a empresa tinha sido vítima de uma tragédia. 'A empresa foi vítima de uma tragédia'! O governador Fernando Pimentel (PT/MG) se reuniu com os diretores da Samarco e deu uma entrevista dizendo que era solidário com a empresa.
O ICMBio e o Ibama não têm competência para avaliar a extensão do desastre, então contrataram uma consultoria internacional, que concluiu que houve um abalo sísmico e que nem é possível fazer um seguro – porque essas grandes corporações têm seguros bilionários dessas minas. Mas, ao concluir um laudo – uma auditoria interplanetária! – dizendo que foi um acidente sísmico, você não só dá um chapéu no seguro: dá um chapéu em todo mundo, um chapéu tipo mexicano, um amplo chapéu em todos os otários do planeta.
Tenho a impressão de que eles estão arrumando uma maneira de dar no pé, sair da cena do crime, sem nem pedir desculpa. Se continuarem espremendo a Vale e a Samarco, eles podem arrumar uma maneira de a Samarco decretar insolvência, falência, ou qualquer coisa do tipo, sumir daqui e reaparecer em qualquer outro continente depois, detonando o planeta, sem pagar a conta do que eles deixaram pra trás.
Esse evento denuncia um quadro global, no qual paisagens, territórios e comunidades humanas fazem parte de um pacote que essas grandes fortunas, através das suas corporações, continuam tratando como material descartável. Nós somos ajuntamentos nada relevantes para esses caras e eles nos manipulam do jeito que querem. Somos colônias avassaladas. Esses caras fazem o que querem com os nossos territórios, nosso litoral, nossa floresta.
O Rio Doce só grita de uma maneira incontida o fato de estarmos todos sujeitos a ser plasmados por uma meleca tóxica dessas em qualquer lugar e não ter nem a quem reclamar. Nós estamos em maus lençóis”.
Entrevista realizada por Marília Senlle, Mario Brunoro, Rafael Monteiro Tannus e Tatiane Klein

Relatório da ONU: órgãos prestam contas e se comprometem a dialogar para cumprir recomendações em favor dos povos indígenas

Audiência Pública debateu recomendações das Nações Unidas para combater violações e garantir direitos dos índios


MPF

Mais de 400 indígenas de várias regiões do Brasil, entidades e instituições se reuniram no auditório da Procuradoria-Geral da República, em Brasília, nessa quinta-feira, 10 de novembro, para debater e encontrar formas de cumprir as recomendações da relatora especial sobre os Direitos dos Povos Indígenas da ONU, Victoria Tauli-Corpuz. 


Divulgado em setembro, durante a 33ª Reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o relatório trouxe conclusões preocupantes sobre a atual situação das populações indígenas no Brasil. O documento destaca que esses povos estão mais vulneráveis agora do que em qualquer outro tempo desde a Constituição em 1988.

Durante cerca de nove horas, as instituições citadas no relatório tiveram espaço para apresentar um balanço das ações que têm desenvolvido e o que poderão fazer para garantir o cumprimento das recomendações. Os indígenas também aproveitaram o momento para  apresentar reivindicações e expressar o descontentamento com a forma como são tratados pelo governo. 

Saúde e educação – A atual situação da saúde indígena é uma das maiores reclamações dos indígenas que protestaram com cartazes, faixas e palavras de ordem contra a tentativa de desmonte do subsistema de saúde indígena

Para a plateia de indígenas, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, anunciou a criação de um Grupo de Trabalho que vai contar com membros do Ministério da Saúde, das organizações indígenas e dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena (Condisi), colegiados regionais de controle social e fiscalização da saúde indígena.  

“Faremos um debate de qualidade com os Condisis para termos elementos para tomar decisões no sentido de estruturar melhor a saúde indígena. Esse modelo que temos hoje é considerado precário, faremos mudanças com debate e consulta aos povos indígenas”, reforçou. Ele informou que o ministério está “dedicado a fazer um trabalho para resolver” o que foi destacado no relatório. 

Na área de educação, a secretária de educação continuada, alfabetização, diversidade e inclusão Ivana de Siqueira admitiu que há muito o que avançar. Segundo o Ministério da Educação, no Brasil há mais de 3 mil escolas indígenas, 93% em terras indígenas, com 285 mil alunos matriculados sendo atendidos por mais de 20 mil professores indígenas. No ensino superior estima-se que há mais de 22 mil alunos indígenas.  

Para Ivana, os números mostram o avanço e sinalizou a construção de escolas indígenas e a implantação do ensino médio como desafios a serem enfrentados para melhorar a educação nas comunidades. A secretária enfatizou que o diálogo está aberto e que melhorias têm sido discutidas entre índios e governo nas conferências regionais de educação indígena, com a participação das comunidades e estudantes. 

Funai – As recentes propostas de redução do orçamento e de pessoal da Funai foram durante criticadas no relatório de Victoria Tauli-Corpuz, que ressaltou a necessidade de fortalecer o órgão indigenista  para  possibilitar  o  Estado  de  atender  suas  obrigações  legais  para  com a  proteção 
dos direitos dos povos indígenas. Nesse sentido, o presidente interino do órgão, Agostinho do Nascimento Netto, admitiu que o orçamento para 2017 é insuficiente, mas que tem conseguido sensibilizar autoridades para a necessidade de reforço orçamentário. 

Além disso, atitudes estão sendo tomadas internamente, garantiu Agostinho. “Há um esforço para a otimização das rotinas de trabalho da Funai para que processos de demarcação cheguem a termo com serenidade, sob pena de a situação indefinida do território acabar servindo para mais conflitos”. Ele também garantiu finalização do concurso público para a Funai. 

Meio Ambiente – Em nome do Ministério do Meio Ambiente (MMA), a secretária de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável, Juliana Simões, reafirmou o compromisso com todas as recomendações presentes no relatório. 

Segundo a secretária, o ministério se compromete a fazer consultas aos povos indígenas para qualquer medida que seja tomada pelo MMA e que os afete, respeitando a Convenção 169 da OIT. Para conciliar situações de  sobreposição de terras indígenas e Unidades de Conservação, Juliana projetou que o MMA tem priorizado instrumentos como a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental (PNGATI). “Os povos indígenas são os que mais conservam os recursos naturais no Brasil”, reconheceu. 

Demarcação e conflitos agrários- A demora nos processos de demarcação das terras é um dos maiores problemas dos povos indígenas e gatilho para várias outras violações de direitos, segundo relatório da ONU. Atualmente, há aproximadamente 150 terras indígenas em estudo, cerca de 200 reivindicadas, mas sem qualquer providência por parte do Estado para demarcação, e 107 demandas por reestudo (revisão) de área.

Sobrevivente do ataque contra indígenas em agosto desse ano em Caarapó, Mato Grosso do Sul, líder Guarani-Kaiowá Elson Kaiowá pediu mais respeito aos povos indígenas. “Respeitem nossas tradições, não somos problema. Nosso futuro está no nosso tekoha (território)”, alertou.  

O procurador da República no Mato Grosso do Sul Marco Antônio Delfino apresentou um histórico de violações cometidas contra os povos indígenas no estado e apontou a necessidade de criação de uma Comissão Nacional da Verdade para investigar o tema.  

Nações Unidas – Acompanhando todo o debate, o representante do Escritório de Prevenção ao Genocídio e Responsabilidade de Proteger da ONU, Davide Zaru, informou que levará as informações à relatora especial Victoria Tauli-Corpuz. 

Segundo Zaru, o debate revelou que todos os atores estão cientes das dificuldades apresentadas e diagnosticou que a dificuldade está na implementação das soluções. “Meu desejo é que utilizemos 100% do que aprendemos e escutamos nessa audiência. Nós [ONU] não temos varinha mágica, mas vamos nos empenhar para ajudar na solução dos problemas”, informou.  

A relatora de Direitos Humanos e Povos Indígenas, Plataforma Dhesca Brasil, Érika Yamada ressaltou que é “preciso transformar o relatório em ações reais e concretas”. 

“A nossa responsabilidade é grande, temos o compromisso de levar adiante todos os compromissos assumidos”, projetou o coordenador da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais, o subprocurador-geral da República Luciano Mariz Maia, anfitrião da audiência. "A 6CCR vai realizar o monitoramento da implementação das recomendações por meio dos grupos de trabalho existentes, ou com indicação de relatores temáticos, onde se fizer necessário, e dará continuidade ao diálogo pela efetiva realização, em consulta direta às comunidades indígenas, e às instituições locais", completou.

A íntegra da audiência em vídeo será disponibilizada em breve.

14 de novembro de 2016

Violações aos direitos indígenas são debatidos no Médio Solimões

                                          Povo Kanamari. Foto _ J. Rosha/Cimi Norte I 

Assessoria de Comunicação - Cimi/Tefé 

Acontece nos dias 17 e 18 de novembro, na aldeia Porto Praia/Tefé, Amazonas, o lançamento do Projeto “Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes”. O projeto recebe apoio financeiro da Agência Católica para o Desenvolvimento no Exterior - CAFOD-Brasil, da Inglaterra e País de Gales, e da União Europeia.

Com duração de três anos, várias atividades estão previstas em três eixos temáticos: formação político-jurídica, proteção e incidência e fortalecimento institucional. Dentre as atividades previstas estão a articulação e mobilização nas aldeias; oficinas de formação; Mutirões de Direitos; encontros regionais, troca de experiências, estudos de caso, audiências com o poder público e campanhas de sensibilização social nos municípios de Tefé, Japurá, Maraã, Itamarati e Carauari.
 

Desde 2014, a Cáritas de Tefé e o CIMI vêm realizando consultas nas aldeias a fim de identificar os casos de violações dos direitos dos povos Kambeba, Maku Nadeb, Kanamari, Miranha, Kokama, Ticuna, Maku Nadeb, Mayoruna e Madja Kulina. Com este diagnóstico, as lideranças e organizações indígenas ampliarão seus conhecimentos e poderão, elas mesmas, debater e pleitear perante os órgãos competentes, reparações das violações sofridas e medidas preventivas para protejer as comunidades e seus membros das ameaças que lhes incidem.

Destaca-se, para esse resultado, os Mutirões de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, que reunirão diferentes órgãos públicos, federais e municipais, com poderes de incidência e/ou resolução dos problemas de violação de direitos.
 

Concretamente, os resultados vão incidir sobre um universo de mais de 3.660 pessoas (1882 homens e 1.778 mulheres), das 27 aldeias visitadas e seis organizações indígenas dos cinco municípios do Médio rio Solimões e afluentes. Indiretamente, serão mais de 22 mil pessoas (49,6% mulheres) alcançadas, sendo 19.145 pessoas pertencentes dos 14 povos indígenas, 40 representantes de órgãos públicos e sociedade civil e 3 mil pessoas do público geral impactados pelas ações.
 

Durante o lançamento do projeto acontecerá o 1º Mutirão de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas. Vários órgãos públicos estão convidados, entre eles a Prefeitura de Tefé, Secretaria Especial de Saúde Indígena - SESAI, Conselho Tutelar de Tefé e Secretaria de Segurança Pública. Também estará presente a  representante da CAFOD-Brasil, Esther Gillingham e a assessora jurídica do projeto, Dra. Chantelle Teixeira.
 

Abaixo segue a programação detalhada. Para outras informações, o projeto conta com uma assessora de comunicação. Agradecemos a atenção e a divulgação.

Contatos/Imprensa: 
Coordenação Geral: Raimundo Freitas - (97) 99214-1858 / (97) 3343-2544
Assessoria de comunicação: Lígia Kloster Apel - (86) 99909-8797

Seminário de Lançamento do Projeto “Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes” 


MUTIRÃO DE DIREITOS

Local: Aldeia Porto Praia / Tefé

Data: 17 e 18 de novembro de 2016
Objetivo: Apresentar para a sociedade de Tefé e iniciar os diálogos para as ações do projeto "Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes"   

Programação


1º DIA
 

7:30 – Saída de Tefé
8:00 – Recepção dos participantes e boas vindas com café da manhã 
8:30 – Mesa de Abertura – com representantes das instituições ligadas ao projeto: Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes: Anilton Brás/tuxaua da comunidade Porto Praia; André Cruz/ coordenador geral da UNIPI-MSA; Raimundo Freitas/coordenador do projeto pelo CIMI Tefé; Mirian Carla Castro/secretária executiva da Cáritas; Tomé Cruz/representante da FUNAI; Esther Gillingham/representante da CAFOD no Brasil.
9:15 – Apresentação sobre a atual conjuntura local em relação à efetivação dos direitos civis, políticos, sociais e indígenas – Raimundo Freitas/coordenador do projeto pelo CIMI Tefé e Dra. Chantelle Teixeira/assessora jurídica do projeto.
10:00 – intervalo
10:15 – Apresentação do projeto "Garantindo a defesa de direitos e a cidadania dos povos indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes" –  Raimundo Freitas/coordenador do projeto pelo CIMI Tefé.
Mutirão de direitos:
10:45 – Palestra sobre direitos civis, políticos, sociais e indígenas e seu amparo na legislação nacional e internacional – Dra. Chantelle Teixeira/ assessora jurídica do projeto.
11:30 – Perguntas da plenária
12:00 - almoço
14:00 – Apresentação sobre os casos de violações de direitos indígenas apurados na 1ª Oficina de Formação Jurídico-Política em Tefé – Dra. Chantelle Teixeira/assessora jurídica do projeto.
14:30 – Construção de um painel e formação de Grupos de Trabalho para complementação e análise dos casos apresentados 
15:00 – Apresentação sobre casos de violação de direitos acompanhados pela UNIPI-MSA – André Cruz/ coordenador geral da UNIPI-MSA.
15:30 – Construção de um painel e formação de Grupos de Trabalho para complementação e análise dos casos apresentados (idem)
16:00 – intervalo
16:30 – Plenária – apresentação das discussões realizadas nos grupos e leitura do Painel.
17:00 – Encerramento

2º DIA
 

7:00 – Café da manhã
8:00 – Apresentação dos órgãos e instituições presentes acerca do trabalho que realizam com os povos indígenas na região. Instituições e Órgãos públicos convidados: UNIPI (confirmado), SEMED, SESAI (confirmado), SEMASC, Justiça Federal, MPE, Conselho Tutelar (confirmado), Secretaria de Segurança Pública, Cartório de Registros Públicos e Prefeitura de Tefé (confirmado).
9:30 – Perguntas da plenária
10:00 – intervalo
10:15 – Palestra com a FUNAI sobre a atuação da CTL em Tefé.
10:45 – Perguntas da plenária
11:00 –  Fala do Movimento de Mulheres de Tefé.
11:30 - Fala do representante  da Articulação Nacional das Juventudes de Povos e Comunidades Tradicionais.
11:30 – Perguntas da plenária
12:00 – Almoço
14:00 – Leitura do painel – Apresentação das discussões realizadas no dia anterior sobre os casos de violação de direitos indígenas.
14:30 – Diálogo com o poder público – formação de uma mesa com representantes dos órgãos públicos presentes para que comentem os casos apresentados.
15:30 – Plenária – considerações acerca dos comentários apresentados
16:00 – Intervalo
16:15 – Diálogo com o poder público II - encaminhamentos: propostas dos órgãos públicos presentes para a solução dos casos de violações de direitos apresentados
16:45 – Plenária – considerações acerca das propostas apresentadas
17:00 – Leitura e assinatura de documento para estabelecer compromisso entre os órgãos públicos e os povos indígenas da região de Tefé
17:30 – Encerramento com apresentação cultural dos alunos indígenas da escola da comunidade.

Justiça Federal determina o despejo de 500 famílias Pataxó em benefício de empresa do setor imobiliário

Povo Pataxó em Brasília durante ritual. Foto _ Egon Heck/Cimi


Os Pataxó vivem sob uma ofensiva de reintegrações de posse articulada pelo mercado imobiliário, no litoral baiano. Menos de um mês depois do despejo de 30 famílias da aldeia Aratikum, a Justiça Federal de Eunápolis determinou o uso de força policial para retirar 500 famílias das aldeias Morapé 1 e 2, Nova Coroa, Tapororoca, Txica Mayruá e Novos. A decisão é de 25 de outubro, mas a Fundação Nacional do Índio (Funai) só foi comunicada na última terça-feira.


As seis aldeias ocupam 3 mil hectares dos 5 mil reivindicados pelo povo Pataxó como parte da revisão de limites da Terra Indígena Coroa Vermelha, entre os municípios de Santa Cruz Cabrália e Porto Seguro. Com uma população de 1.546 indígenas, conforme censo do povo, vivendo em 1.493 hectares, a demarcação deixou de fora a demanda territorial que aguarda a publicação do relatório circunstanciado pelo Ministério da Justiça.  

Na última semana, os Pataxó realizaram manifestações em Cabrália e Porto Seguro, além  de trancar alguns trechos da BR-367, que liga os dois municípios. Em Brasília e Salvador, lideranças do povo estiveram com representantes dos governos federal e estadual. As pressões surtiram efeito e o despejo marcado para o dia 11 não ocorreu. Na sexta-feira, 18, uma mesa de diálogo com os autores do pedido de despejo deverá acontecer.

“Fomos surpreendidos porque essa mesa de diálogo, mediada pela Justiça Federal, foi marcada antes da decisão de reintegração. O juiz titular da comarca de Eunápolis saiu de férias, e ele estava acompanhado a situação, e o juiz substituto deu o despejo”, explica o presidente da Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia, cacique Aruã Pataxó.   

Tal como na reintegração imposta aos Pataxó da aldeia Aratikum, os autores do pedido de despejo são ligados ao setor imobiliário. A empresa Gois Cohabita alega ser proprietária da área ocupada pelas seis aldeias da Terra Indígena Coroa Vermelha. Depois da passagem da seleção da Alemanha pela região na Copa do Mundo de 2014, o mercado imobiliário foi insuflado visando a construção de grandes empreendimentos turísticos.   

“O que pedimos à Funai e ao Ministério da Justiça é que publiquem o relatório de demarcação porque a morosidade traz insegurança jurídica e permite todas essas reintegrações. São famílias que vivem de forma plena em terras tradicionais, e que de repente estão com a polícia em suas portas mandando que elas saiam. A Funai nos informou que até o relatório fundiário já está pronto”, diz cacique Aruã.

Conforme o Banco de Terras do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), atualizado semanalmente, na Bahia existem 34 terras indígenas: dez encontram-se com o procedimento demarcatório inconcluso, parado em alguma etapa, e sete estão sem nenhuma providência administrativa de demarcação. Outras dez estão registradas, última etapa do processo, seis reservadas (adquiridas pelo governo) e uma dominial.

Vida plena

A aldeia Nova Coroa possui escola, água encanada, atendimento de saúde e recebe recursos assistenciais diversos do governo federal. O que possibilitou, ao lado das práticas tradicionais do povo, como a agricultura e a pesca, uma vida plena durante os dez anos em que os Pataxó retomaram a área. Assim ocorre com as outras cinco aldeias, estabelecidas também durante a última década.  

Cacique Aruã Pataxó ressalta que os 5 mil hectares reivindicados na revisão sempre foram compreendidos pelos indígenas como tradicional. “Está no relato de nossos antigos, faz parte da gente”. Para a liderança, se deseja retirar 500 famílias de uma condição digna e tradicional de vida para lançá-las no confinamento da porção registrada da Terra Indígena Coroa Vermelha ou para as margens da BR-367.


“Vemos um país totalmente dominado pela elite. As bancadas da Bala, do Boi e da Bíblia atuam no Congresso Nacional diretamente para desfazer direitos fundamentais. Aliado a isso temos o sucateamento da Funai, que vai piorar ainda mais com a PEC 241 (agora 55 no Senado Federal) de congelamento dos gastos primários. Temos um cenário de perigo aos direitos constitucionais dos povos indígenas”, analisa cacique Aruã.