8 de dezembro de 2015

Ao invés de interrogada sob suspeição na morte de Semião Vilhalva, a produtora e presidente do sindicato rural de Antônio João depõe na CPI do Cimi (MS)

Foto David Majella _  El País

Assessoria de Comunicação - Cimi

Fazendeira que incitou e liderou ataque contra Ñanderú Marangatú depõe nesta terça, 08, na CPI do Cimi

No último dia 29 de agosto, Roseli Silva encerrou de forma abrupta uma reunião entre fazendeiros e parlamentares ruralistas. Era uma manhã de sábado no município de Antônio João (MS). Dias antes, o povo Guarani e Kaiowá havia retomado áreas tradicionais no interior da Terra Indígena Ñanderú Marangatú, homologada em 2005. A fazendeira, presidente do Sindicato Rural de Antônio João, afirmou que sairia do encontro para reaver o que era dela, uma fazenda de criação de gado ocupada pelos indígenas. Roseli, porém, não foi sozinha: por ela já esperava um bando empoleirado em cerca de 100 camionetes.
O resultado da incitação à violência foi um ataque covarde, acompanhado de perto pelo Departamento de Operações de Fronteira (DOF) e pelo deputado federal Luiz Henrique Mandetta (PSDB/MS). Uma criança de colo levou um tiro de bala de borracha (foto), de uso restrito da polícia. Enquanto procurava o filho pequeno no meio do alvoroço provocado pela ofensiva, Semião Vilhalva Guarani e Kaiowá foi atingido no rosto por um tiro disparado do local em que estavam os homens liderados por Roseli. Morreu no local. Uma emissora de televisão filmou todo o desenrolar da história e chegou a ser impedida de prosseguir com o trabalho, já durante a invasão, tendo um cartão de memória da câmera retido por fazendeiros.
Nesta terça-feira, 08, pouco mais de três meses depois da morte de Semião, Roseli irá prestar depoimento à CPI do Cimi, a partir das 14h30 (fora do horário de verão), na Assembleia Legislativa do Mato grosso do Sul - assista aqui. A fazendeira foi convocada por um pedido articulado pela dupla de deputados ruralistas Mara Caseiro (PTdoB), presidente da CPI, e Paulo Corrêa (PR), relator da comissão. O depoimento de Roseli, conforme o apurado junto a assessores parlamentares, será induzido por Mara e Corrêa como a de uma testemunha e vítima do Cimi. Tal estratégia ruralista não é novidade na CPI, depondo uma vez mais para a falta de lisura e isenção dos trabalhos da comissão.  
Mesmo com todas as provas de que Roseli incitou e liderou o ataque contra os Guarani e Kaiowá, que culminou na morte de Semião, a fazendeira não foi responsabilizada e punida - o ataque de 29 de agosto não foi o único liderado por Roseli. Sem sucesso na primeira empreitada violenta contra os indígenas, dias depois Roseli liderou novo ataque. Dessa vez ela e mais um bando armado conseguiram entrar na sede da fazenda, à noite. Os indígenas correram para se proteger, mas não saíram da área.
Apenas depois de todos esses acontecimentos, um pedido de reintegração de posse para quatro fazendas incidentes em Ñanderú Marangatú foi feito à Justiça Federal, que concedeu a liminar. O Supremo Tribunal Federal (STF), porém, a suspendeu por decisão da ministra Carmem Lúcia, em meados de outubro. O pedido de despejo dos indígenas foi arquitetado pela advogada Luana Ruiz Silva, filha de Roseli. Luana conduz sua atividade profissional no campo do ruralismo, fazendo uso de mentiras e calúnias contra o Cimi. Tornou-se uma ferrenha opositora à demarcação de terras indígenas. Durante as sessões da CPI do Cimi, é comum ver Luana orientando os assessores de Corrêa e Mara.
Roseli volta a ameaçar
Com a suspensão da reintegração de posse, Roseli voltou a ameaçar os Guarani e Kaiowá de Ñanderú Marangatú. Conforme denúncia dos indígenas ao Ministério Público Federal (MPF), a fazendeira teria dito a eles que “iriam pagar por todos os crimes que haviam cometido (sic)”. Na sequência, Loretito Vilhalva foi detido pela polícia em Antônio João por conta de um mandado de prisão em aberto, referente a uma acusação de porte de arma de 2007 – o indígena foi abordado por policiais enquanto caçava. Loretito foi condenado a cinco anos de prisão no regime aberto. No mesmo dia da prisão de Loretito, outros três adolescentes de Ñanderú Marangatú também foram detidos, dessa vez em incursão policial na terra indígena, sob suspeita de terem matado um não-indígena.
“Loretito precisa ir todos os dias até Ponta Porã para assinar um termo na Justiça de que não fugiu. Os adolescentes não fizeram nada, estavam na aldeia quando esse karaí (branco) morreu na rua (cidade de Antônio João). A gente pergunta: será que isso não é o cumprimento da ameaça da Roseli? Precisa investigar. E também voltaram a atacar nossos acampamentos, justo o de quem: do Loretito, que fica numa fazenda da família da Roseli. Será que não tá tudo ligado?”, analisa uma liderança de Ñanderú - não revelaremos sua identidade por razões de segurança. 

 

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