19 de janeiro de 2015

Jovens Guarani-Kaiowa trabalham como bóias-frias para sobreviver e evitar preconceito na escola

Por Agda Riquelme Rocha, MS*


Guarani children work on the sugar cane fields which now cover much of their people's ancestral lands in Mato Grosso do Sul state
Foto Arquivo  trabalho em canavial/MS_ Survival
Hoje, bem cedinho, vi vários adolescentes e jovens da minha comunidade indígena  esperando ônibus para embarcarem rumo ao estado de Santa Catarina para a colheita da maçã.
Fiquei observando - com muita tristeza e dor no coração -, pois viajarão por vários quilômetros correndo riscos de vida, muitas vezes sem refeição ao longo da viagem. Muitos nem possuem idade suficiente para o trabalho, mas estão indo para comprar peças de roupas, calçados, uma bicicleta nova ou uma motocicleta de segunda mão e para pôr comida na mesa.
Muitos deles são a única esperança de uma família inteira que fica esperançosa e aguarda seu retorno com algum dinheiro. As mães se despedem de seus filhos com o coração na mão; somente sossegam na volta à Aldeia, mas ate lá é muita angústia. Eles também vão para
conseguir roupa nova para usar ao voltarem a estudar. A maioria retorna quase no segundo bimestre do ano escolar.
Nós indígenas somos vítimas frequentes de preconceito em qualquer lugar no nosso dia a dia. Eles não querem ir a escola com uma roupa e calçcado velho, pois quando um jovem é discriminado ou não pode ir trabalhar - ou é impedido pelos seus pais - fica muito triste, se sente um inválido e muitas vezes acaba cometendo o suicídio, isto porque na aldeia superlotada também não há outras opções.
A maioria se sente inferior estudando no meio de não índios que possuem roupas de marcas, calcados e materiais escolares. E somos muito observados. Isso causa muito constrangimento para a maioria dos jovens Guaranis e Kaiowas que vestem a melhor roupa que possuem na escola e, mesmo assim, são discriminados ainda nos ônibus escolares e no próprio recinto escolar.
É muito triste a nossa realidade dentro dos nossos tekohas e fora para os jovens, principalmente, que apesar de tudo ainda lutam pela sobrevivência e existência junto com os demais do seu povo. Mas estamos sempre resistindo, mesmo sendo esquecidos pelo Poder Público, pelo Estado brasileiro e pela Justiça que nunca devolvem nossos tekohas sagrados. Que Nhanderu abençoe os povos indígenas desse Brasil e suas lutas e, também, todos aqueles que lutam ao nosso lado pela justiça aos excluídos em uma sociedade preconceituosa e gananciosa!

Agda Riquelme Rocha é uma jovem estudante Guarani-Kaiowa que está pleiteando uma vaga para o curso de Direito


Edição _ Tereza Amaral

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